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O sentimento, força existencial da natureza humana
SABER & VIVER
01/12/2025 14h05
Por: Heitor Silva Fonte: OBSERVADOR

Entre os múltiplos aspectos que configuram a psicologia humana, o que diz respeito à sensibilidade é um dos mais importantes e que mais influem durante o curso da vida.

O estudo a fundo desta questão, dada a sua peculiaridade íntima, merece uma discriminação de seu conjunto. Assim, e para obter uma mais clara e precisa compreensão dos valores que representa, será necessário classificá-la em duas categorias. A primeira abarcará tudo o que diz respeito ao próprio sentir nas relações do ser consigo mesmo; a segunda, toda a extensão que transcende a órbita da primeira.

Em ambos os casos, a sensibilidade costuma se aguçar, seja por aquilo que afeta o ser de modo íntimo e pessoal — quer dizer, pelo que o afeta diretamente —, seja pelo que afeta exclusivamente os demais. O mesmo se dá com os acontecimentos felizes, de grata repercussão para a vida.

Uma circunstância, um acidente, uma desgraça, seja pela perda de seres queridos ocasionada por distanciamentos ou falecimentos, seja por perda de bens etc., produz lógicos abalos sensíveis em quem é atingido por tais coisas, sendo sua própria consciência a que registra o fato que o comoveu.

Mas, quando o que ocorre afeta a outro e igualmente se sente uma profunda comoção, o fato então assume um caráter diferente. Este é o caso que motiva nosso estudo, pois o consideramos o mais importante e o que mais vivo interesse desperta, por sua especial particularidade.

Quando se chega a sentir — ou, melhor dizendo, quando se experimenta um sentir de tal natureza por outro ser —, estabelece-se de fato um vínculo existencial, ou seja, conectam-se duas existências sensíveis. Sendo assim, produz-se uma espécie de prolongamento da vida de um em outro, pois tudo o que acontece com aquele a quem se estende o sentir é como se acontecesse com o próprio que experimenta o efeito sensível.

Adquire esse efeito maior intensidade ao manifestar-se pela força de um afeto, e mais elevada condição quanto maior for a pureza e o desinteresse que o inspire.

A natureza humana costuma reagir por meio da expressão dos próprios sentimentos quando outros seres sofrem injustiças. Neste caso, sente com a humanidade e experimenta a angústia que sua própria sensibilidade exterioriza como sinal inconfundível de solidariedade para com seus semelhantes.

Agora, quando o sentir se circunscreve a seres determinados, estabelece-se, como ficou dito, uma vinculação existencial, ou seja, a extensão do sentimento de um ao sentimento do outro. É a vida que se amplia, experimentando o ser em si mesmo os sofrimentos, contrariedades ou alegrias que se promovem na vida daqueles que estão conectados a seu sentir.

Daí que seja tido em grande apreço tudo que se refere ao sentimento.

Também se podem estabelecer vinculações intelectuais; porém, estas não passam de meras formas de convivência comum. Não obstante, a vinculação intelectual pode criar a vinculação simpática, o que significa que se haveria dado, por influência da simpatia mútua, um passo mais em direção ao ser interno. Com isso, pode-se condensar um sentimento de afeto cuja expressão sensível é o laço existencial que une e prolonga a vida de um em outro.

O exposto dá a pauta para julgar a importância de que se reveste o sentimento no ser humano e, ao mesmo tempo, mostra que o sentimento é uma força existencial que deve ser considerada como parte da própria vida. Se tal força é afetada, a vida sofrerá em idêntica proporção a repercussão da alteração produzida.

Portanto, quem preserva seus sentimentos de qualquer perturbação estranha à sua sensibilidade preserva também sua paz interna e a felicidade que a existência deles oferece a quem os cultiva com amor e conhecimento. A destruição de um sentimento implica a destruição de uma porção de vida, a qual teria sido animada pela força de um afeto que, por si mesmo, faz parte da própria vida.a