A vida em primeiro lugar é o inegociável e insubstituível princípio do Evangelho da vida, centro da mensagem de Jesus. Solenemente, o Mestre proclama: “Eu vim para que todos tenham vida e a tenham em abundância”. Os que creem em Jesus Cristo, em diálogo e cooperação com os que defendem a vida desde a concepção até o declínio com a morte natural, se posicionam, sem concessões, contra o aborto. Não há espaço para ceifar vidas – um desatino criminal – ampliando legislações abortistas, sob a justificativa de que se busca solução para outros problemas graves. A correção de descompassos que sacrificam vidas humanas não pode significar a eliminação de outras vidas, dos nascituros, especialmente indefesos. Por isso mesmo, a Igreja Católica se opõe ao precedente que se busca abrir com a Arguição do Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 442, em análise no Supremo Tribunal Federal. Esse precedente diz respeito à consideração da legalidade do aborto até 12ª semana de gestação. E a Igreja é contra a legalização do aborto.
Quem defende a legalização do aborto fundamenta-se em três princípios: o primeiro princípio refere-se à consideração que a vida uterina tem irrelevância jurídica. Essa premissa pode levar à legalização do aborto em outras fases da gestação, como ocorre em outros países. O segundo princípio relaciona-se à “proteção gradativa da vida”. Isto significa considerar que o ser humano, a depender do estágio de sua vida, se torna mais ou menos merecedor da proteção de seu direito de viver. Quem defende a legalização do aborto ainda se apega a uma terceira premissa: o direito constitucional ao aborto que, sublinhe-se, não existe na Constituição Federal do Brasil. Uma discussão tão séria, com consequência direta na promoção e defesa da vida, deve motivar a sociedade brasileira a questionar: por que não se aceita a participação de instituições representativas e de reconhecida autoridade moral e social, a exemplo da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), nessa discussão que ocorre na Suprema Corte? Oportuno lembrar que o diálogo com diferentes segmentos é um dos pilares da sociedade democrática.
Ao invés do diálogo, o calendário proposto para a discussão do tema revela desrespeitos à democrática participação. Há de se considerar que um tema de graves repercussões, que está em confronto com o pensamento antiabortista da maioria da população brasileira, não pode se limitar a uma discussão restrita – respeitada a competência do Supremo Tribunal Federal (STF). Ao deliberar sobre o aborto, sem envolver ampla participação democrática, a Suprema Corte é chamada a responder: o STF considera o Congresso omisso e, por isso, ultrapassa a sua própria competência para legislar sobre o aborto? Oportuno lembrar que essa discussão, sem envolver o Parlamento, representa ferida na democracia, pois além de desconsiderar a participação da sociedade civil, também não contempla os representantes eleitos pela população. Trilhe-se adequadamente o caminho para tratar tema tão grave – não por uma ADPF, que parece ter mais força que grande parte da população brasileira e de procedimentos democráticos. Importante recordar que o Brasil é signatário de tratados internacionais em que se compromete a proteger a vida.
Aborto é a eliminação de uma vida humana. E ninguém tem o direito de escolher se uma pessoa deve ou não viver – todo ser humano é sagrado. Legalizar o aborto é uma imoralidade e, por isso mesmo, todos que são fiéis ao Evangelho da Vida devem se posicionar pela defesa de cada ser humano, especialmente dos nascituros e vulneráveis. A discussão no STF conduza a aprimoramentos de princípios democráticos, que demandam iluminação de parâmetros morais. Esses princípios contribuam para que representantes do povo brasileiro definam necessárias políticas públicas, pois é justamente a ausência dessas políticas que, equivocadamente, fundamenta o argumento de quem defende o crime do aborto. O rico horizonte do Evangelho da Vida precisa emoldurar o entendimento jurídico e sociopolítico da sociedade, para que todos reconheçam a dignidade incomparável de cada ser humano.
A vida humana, para além de suas dimensões terrenas, contempla a participação na vida de Deus. A sublimidade dessa vocação sobrenatural revela o valor e a grandeza do ser humano, que precisa ser respeitado em todas as etapas de sua existência. Por isso, a Igreja sabe e faz ecoar na interioridade de crentes e não crentes, pela luz da razão e por força da graça, o reconhecimento da Lei Natural que está inscrita no coração humano. Essa Lei Natural expressa o valor da vida de cada pessoa, desde a concepção até o declínio natural. Não se pode contemporizar e relativizar essa Lei Natural inscrita no coração, tornando urgente e massivo o anúncio do Evangelho da vida, para debelar todas as ameaças à existência humana – aborto, guerras, misérias, violências e discriminações. O panorama atual é inquietante e exige coragem profética, em uma movimentação forte e veloz, para reverter situações configuradas pelo mal. Nesta perspectiva, todos se unam para que o Brasil não se afaste do horizonte de sua Constituição Federal, não aprove o aborto, uma derrocada moral. É preciso discernir entre o bem e o mal pela luz do Evangelho da Vida, pela lição de colocar sempre a vida, dom sagrado, em primeiro lugar.
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